A Cia Teatral As Tias comemora 10 anos em 2025 com a montagem “Flor Do Lácio”, contemplada pelo 44º Fomento ao Teatro para a cidade de São Paulo que viabiliza a continuidade de sua pesquisa dramatúrgica ancorada em poesias. O grupo é uma criação das atrizes Maria do Carmo Soares e Salete Fracarolli. Desde a primeira montagem e fazendo parte da trupe estão: Jô Rodrigues, Cibele Rodrigues, Tato Fischer e Marcos Thadeus. “Flor Do Lácio” comemora os 500 anos do nascimento de Camões, que, com sua obra Os Lusíadas, marca o nascimento da Língua Portuguesa. Com todas as transformações no decorrer de todos esses séculos, sua obra ainda é necessária e mantém vivo o desejo de ler, ouvir ou ver sua obra.

Assim como Os Lusíadas, a montagem tem quatro momentos que percorrem sua dramaturgia ancorada em poesias de Camões e outros poetas de Língua Portuguesa, como: Bocage, Fernando Pessoa, Césario Verde, Sá de Miranda, Florbela Espanca e outros. Abordando temas como a fundação da língua portuguesa, a viagem, a vida e a morte. A dramaturgia é ancorada na poética de autores lusófonos em uma costura que permeia a palavra e os sentimentos abordados nas obras que foram selecionadas a partir de uma pesquisa entre elenco e direção da montagem. Com humor e sutilezas, alguns poemas foram musicados passando por ritmos do fado ao rap, outros interpretados e declamados pelas quatro atrizes da melhor idade, que tiveram a maior parte de suas vidas dedicadas ao ofício do teatro, acompanhadas ao vivo por um músico ao piano.
Sobre a pesquisa e os textos – De Camões a Pessoa

Maria do Carmo conta que a ideia de fazer Camões surgiu em 2019, quando As Tias estavam em temporada com o espetáculo Ismália, na Biblioteca Mário de Andrade. “Saímos Salete, Marcos e eu para jantar e lá contei que quando tinha 13 anos a primeira poesia que declamei na Escola lá no Paraná foi Camões… ‘Alma minha gentil, que te partiste…’. E aí, pensei, vamos fazer Camões. E topamos iniciar a empreitada….”, relembra. Marcos Thadeus estudou Letras na faculdade e buscou aprofundar a pesquisa sobre a Língua Portuguesa e trouxe a história de sua origem na região do Lácio. “Por isso, a Língua Portuguesa é conhecida como a última “Flor Do Lácio”. Inclusive, é um trecho de uma poesia do Bilac que fazíamos em Ismália. E assim batizamos de “Flor Do Lácio””, conta o ator.
“De lá para cá nunca paramos a pesquisa, e nos aprofundamos lendo outros poetas da língua portuguesa de outras nações. À medida que a pesquisa foi crescendo o projeto foi sendo inscrito em muitas leis de incentivo, foram vários editais… E tínhamos muita expectativa por conta de 2024 ser o ano de comemoração do Camões, por conta dos 500 anos. E não é que deu certo com o Fomento? Que além de podermos completar a pesquisa, montar e apresentar a peça, será lançado no segundo semestre um livro sobre os 10 anos de As Tias e terá um capítulo dedicado a biografia artística de cada atriz, isso foi invenção do Marcos. Também voltaremos com mais sessões do Ismália pela cidade de São Paulo”, prossegue Maria do Carmo.
Para Salete Fracarolli, comemorar os 500 anos de Camões é inevitável. “Ele foi fundamental na consolidação da língua portuguesa como conhecemos hoje. A escolha por integrar poesia à dramaturgia veio da nossa pesquisa de linguagem e da vontade de trazer à cena não só Camões, que representa 70% do espetáculo, mas também outros poetas lusófonos como os de Moçambique, Guiné-Bissau e Angola. Já trabalhamos poesia em outros espetáculos, e agora, nada mais justo do que celebrar nossa língua com o grande poeta Camões. Selecionamos poemas que resultassem num verdadeiro espetáculo teatral — com música, encenação, sem pieguismo ou cara de sarau”, explica ela.
“Escolhemos poesias a partir de Os Lusíadas para contar as aventuras de Camões — suas viagens, batalhas, perdas e descobertas”, complementa Salete. “Ele narra desde o olho perdido no Marrocos até a passagem por Moçambique, o Cabo da Boa Esperança, a Índia e a China. Tudo isso está em seus versos, como quando ele descreve Portugal como ‘onde a terra se acaba e o mar começa’. Usamos também sonetos e integramos outros poetas que dialogam com essas experiências. Camões cantou as descobertas portuguesas pela poesia — e como nossa pesquisa de linguagem também é poética, nada mais justo do que fazer um espetáculo baseado nisso.”
O poeta e a Língua Portuguesa

Maria do Carmo ressalta que a importância de fazer Camões hoje em dia é ele ser o primeiro da Língua Portuguesa, “ele foi o primeiro a dar uma roupagem a nossa língua. Não só pelos 500 anos. Mas se conseguirmos lançar a semente de conhecerem outros poetas, além de Pessoa e Florbela Espanca…. e quem sabe as pessoas descobrem a beleza dessas poesias e sobretudo a de Camões, que fala tão bonito sobre o amor. As vezes sinto até que o amor do Camões, quase todos foram platônicos, um amor idealizado. E que as pessoas se interessem por esses sonetos extraordinários que falam do amor, da morte e da vida”.
“A ideia é plantar uma sementinha em quem nunca teve contato com Camões — talvez já tenha ouvido falar, mas nunca leu suas poesias. Quem sabe conseguimos despertar uma curiosidade, e a pessoa pense: “amor é fogo que arde sem se ver…” Ah, já ouvi isso em algum lugar… deixa eu procurar, ler na íntegra, entender melhor’”, observa Marcos Thadeus.
Salete Fracarolli esclarece que, no espetáculo, são utilizadas poesias que cantam as grandes aventuras e descobertas, exaltam o espírito lusitano, mas também exploram o lado mais íntimo de Camões — seus amores, suas paixões. “Ele era um amante inveterado, teve muitos romances… ou, no mínimo, celebrou muitas mulheres em seus versos”, relata Salete. “Queremos quebrar essa ideia de que Camões é algo inatingível, difícil de entender. À medida que você lê, vai se apaixonando pelo canto — e quando digo ‘canto’, me refiro aos versos. Ele canta o seu país com poesia, e isso é belíssimo”, diz.
Segundo Maria do Carmo, os 500 anos de Camões são um marco importante para que as pessoas voltem a ler, a estudar, a olhar de novo para a nossa língua. “É sobre o amor e a vida — e isso dá vontade de passar o dia inteiro lendo, porque é maravilhoso, acalma o coração. Cada vez que leio, descubro algo novo: uma figura de linguagem, uma semente que a gente tenta plantar — e, às vezes, elas dão fruto. Tudo isso reverbera. Até mesmo na questão da xenofobia. Esse projeto aproxima a gente. Essa poesia aproxima. Temos a mesma linguagem, uma mesma língua que nos une desde o Lácio”, conclui a atriz.
Sobre a encenação

Para montar a peça, o diretor Fernando Cardoso foi convidado pelo grupo As Tias. “Desde o início, quando me convidaram, já existia a ideia de não focar apenas em Camões, mas também em outros poetas contemporâneos a Camões e um pouco depois, chegando até Fernando Pessoa; porque Camões é o pai da língua portuguesa, é o maior e o mais importante poeta e escritor da língua portuguesa. A ideia era unir as suas ramificações a ele, digamos assim.” A partir das pesquisas de Maria do Carmo Soares e Salete Fracarolli e as contribuições de Cardoso, chegaram a uma seleção definitiva. A partir daí, o encenador criou a dramaturgia. “Ligando uma coisa na outra, inserindo uma poesia na outra”, diz Fernando, acrescentando ainda a pesquisa de outros poemas.
Sobre a estrutura da encenação, há algumas divisões. Fernando explica que elas podem até ser comparadas, de certa maneira, com as divisões que existem nos Lusíadas. “Acho que a peça tem… não sei se a plateia perceberá muito evidentemente, mas diria que o primeiro momento é a pátria, que é a língua portuguesa. O segundo é a aventura, que são as navegações, o amor e a descoberta. O terceiro movimento é a morte, que é o fim. E o quarto movimento é o renascimento, que eu poderia chamar de a eternidade, porque, se a gente for pensar que Camões nasceu há mais ou menos 500 anos e a sua obra perdurou tudo isso, e perdurará, ela é eterna.”
“Outros textos que me ajudaram a construir essa narrativa. Tem dois textos inspirados, por exemplo, em literatura de Cordel, que eu ousei escrever. Não posso chamar de Cordel, mas é inspirado, porque a gente queria contar um pouco da história do Camões, não da obra, mas dele, da figura humana. E eu achava que seria interessante, para não ficar didático, fazer uma brincadeira. Então tem dois momentos em que elas interpretam esse texto todo rimado, e esse texto foi escrito por mim.” Aos textos de Camões foram colados trechos de Florbela Espanca, Fernando Pessoa e alguns poetas portugueses, que terminaram por costurar a dramaturgia.
Ficha técnica
Direção: Fernando Cardoso. Pesquisa e Seleção de textos: As Tias e Fernando Cardoso. Textos adicionais: Fernando Cardoso. Dramaturgia: Fernando Cardoso com a colaboração de Ciça Côrrea e As Tias. Direção e Composição Musical: Tato Fischer. Direção de Movimento: Ciro Barcelos. Direção de Produção: Marcos Thadeus. Elenco As Tias: Cibele Troyano, Jô Rodrigues, Maria Do Carmosoares, Salete Fracarolli e Tato Fischer. Figurinista: Guilherme Rodrigues. Cenografia: Marcos Thadeus. Iluminação: Sarah Salgado E Luana Della Crist. Produção Executiva: Nayara Rocha. Fotografias: Roberto Setton. Designer Gráfico: Rodolfo Rezende / Estúdio.
FLOR DO LÁCIO

Temporada: De 01 de Maio a 07 de Junho
Horário: Quintas e Sextas, às 20h | Sábados e Domingos, às 16h
Local: Av. Ipiranga, 344 – República
Ingressos: R$ 40,00 (inteira) | R$ 20,00 (meia) | Compre aqui
Classificação: 12 anos
- Sessões Acessíveis:
Libras: Dias 15, 16, 17, 18, 22, 23, 24, 25, 29 e 30/05.
Audiodescrição: 24, 25, 29, 30 e 31/05. - Dia 07 de Junho, as sessões serão às 16h e às 19h
- Haverá distribuição gratuita de 30 ingressos por sessão para pessoas 60+ na bilheteria com 1 h de antecedência de cada apresentação.
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