Na peça, os atores Carol Godoy e Rafael Steinhauser dão vida a uma aluna e a seu ex-professor, que se reencontram após 20 anos, em um momento em que ambos enfrentam a necessidade de compreender a impermanência e a finitude que permeiam a vida. A estreia acontece agora, com uma curta temporada no Núcleo Experimental. Além das apresentações, o projeto também inclui uma programação paralela com palestra e oficina com o diretor e dramaturgo Rui Xavier.
A dupla de atores se reencontra após idealizar o espetáculo Vênus Ex Libris, livremente inspirado em A Vênus das Peles de Sacher-Masoch e dirigido por Luiz Fernando Marques. Carol e Rafael decidiram repetir a parceria em uma nova criação. Desta vez, o ponto de partida foi o livro A Agonia de Eros, do filósofo coreano Byung-Chul Han, que explora a crise dos afetos em tempos neoliberais. A obra reflete sobre como as novas tecnologias de escolha e a lógica da positividade e da uniformidade de consumo vêm excluindo a negatividade e as diferenças – elementos fundamentais para uma experiência autêntica de encontro com o outro.

Durante a pandemia de Covid-19, o livro ressoou com novos significados para os atores, motivando uma série de encontros virtuais e trocas de textos autorais com teor autoficcional. Nesta incursão espontânea pela escrita, eles encontraram uma forma de refletir sobre a vida, revisitando memórias pessoais e compartilhando seus medos e dúvidas diante do momento de incertezas e transformações coletivas que o mundo atravessava.
“Desde que começamos a conceber este projeto em 2019, pouco antes da pandemia, mergulhamos na incerteza que provocam os momentos de crise e transição na vida, na pulsão que provoca o encontro de almas sensíveis, na força vital do propósito e na alegria de reconhecer a vida a cada instante”, diz Rafael Steinhauser.
Ao longo dos últimos anos, os atores-criadores dialogaram com outros artistas, enriquecendo o percurso do trabalho que agora chega aos palcos como Apesar de Tudo. O convite a Munir Kanaan, que assina o texto como reação dramatúrgica e também a direção do espetáculo, deu forma final ao projeto.
Recomeços

Em uma instalação cênica que remete a um apartamento, a trama acompanha Ana Beatriz, uma mulher de 40 anos que retorna à sua cidade natal em meio a uma profunda crise de meia-idade, após o fracasso de um projeto profissional importante. Nesse retorno, ela reencontra Ricardo, seu ex-professor universitário, uma figura crucial em sua vida, a quem não via há duas décadas. Prestes a completar 65 anos, ele também vive um momento delicado, marcado pelo fim de um ciclo importante. Em um cenário de reflexões e ressignificações, ambos compartilham os últimos acontecimentos de suas vidas, seus fracassos e perdas, e divagam sobre o futuro e o desejo de recomeçar.
“Queríamos criar uma narrativa que fosse ao mesmo tempo íntima e capaz de gerar identificação, tocando em temas universais como a passagem do tempo, a finitude e nossos eternos recomeços”, explica Carol. “Eu e Rafa começamos a escrever sobre assuntos que nos eram caros, como histórias que revelam a ambição como uma pulsão que nos lança em direção ao mundo e ao lugar que desejamos habitar, e a busca por manter a alegria através das coisas com as quais precisamos nos conectar, para seguir em movimento apesar das adversidades. Em meio à terrível crise sanitária causada pela Covid-19, refletir sobre nossas formas de conexão com a vida tornou-se fundamental, diante (e apesar) de tudo o que estava acontecendo no mundo e do que ainda está por vir. Pensar sobre a importância dos encontros, do pertencimento, da identidade, da presença e da consciência da alteridade foi tanto um estímulo pessoal quanto uma provocação artística para levantar as histórias e situações que constituem a dramaturgia”, conclui a atriz.

Munir integrou o projeto nos últimos meses e foi ele quem provocou os atores, por meio de improvisações gravadas e transcritas, a refletirem sobre a relação deles próprios com os temas que surgiram durante o processo. “Eles emprestaram algumas histórias e olhares pessoais, que se manifestam na forma de um encontro intergeracional entre dois amigos que não se viam há mais de 20 anos. Organizei esse material de forma a criar uma narrativa, acrescentando textos e um pano de fundo que vai sendo revelado aos poucos durante a peça, optando por um teatro do absurdo. É por meio de uma ponte que une os dois no presente que eles vão se questionar e, juntos, buscar novos propósitos e razões para seguir em frente”, explica o diretor.
Programação paralela
Além das apresentações, o projeto também oferece duas atividades à parte, voltada para estudantes de teatro e interessados: uma palestra sobre dramaturgia e uma oficina de atuação com o diretor e dramaturgo Rui Xavier, que acontecem na sede da Corpo Rastreado.
Na palestra “Maneiras de ler, escrever e compreender um texto teatral”, o dramaturgo, ator e diretor Rui Xavier compartilha com os alunos sua pesquisa dramatúrgica, oferecendo a eles os parâmetros de uma técnica dramatúrgica. Experimentado, nos primeiros textos da sua carreira, com formas mais “pós-dramáticas”, Rui se dedica agora à pesquisa do cânone dramático mais estrito, bastante inspirada pela leitura do livro “Para Trás e Para Frente”, de David Ball, um excelente manual de leitura de um texto dramático que usa o Hamlet, de Shakespeare como modelo de investigação. É isso que ele compartilha com o público de sua palestra.

Já na oficina de interpretação “Texto, corpo e subtexto”, Rui oferece práticas que reúnem sua experiência com o texto, o corpo e a palavra. Ele realiza com os participantes exercícios voltados à percepção de como a ‘palavra-pensamento-ação’ do texto teatral deve contaminar a ação física do ator, para o melhor aproveitamento possível, em cena, das proposições da dramaturgia. Tal repertório foi desenvolvido ao longo da sua prática como ator, diretor e dramaturgo, e tem como base sua experiência com Eve Doe Bruce (Theatre du Soleil), Antunes Filho (CPT), Rodolfo Garcia Vasquez (Os Satyros) e como estudante de dança contemporânea.
Para se inscrever, interessados devem pedir o formulário pelo e-mail contato@corporastreado.com
Ficha técnica
Criação e elenco: Carol Godoy e Rafa Steinhauser
Direção: Munir Kanaan
Vídeo projeções e trilha sonora: L.P. Daniel
Iluminação: Rodrigo Caetano
Figurino: Carol Roz
Cenografia: Jorge Luiz Alves e Munir Kanaan
Cenotécnico: Jorge Luiz Alves
Operador de vídeo projeção: Allysson Nascimento
Operador de som: Raul Vicente
Fotografia artística: Marcelo Villas Boas
Palestrante e oficineiro: Rui Xavier
Produção: Corpo Rastreado
APESAR DE TUDO

Temporada: De 28 de Novembro a 08 de Dezembro
Horário: Quinta à Sábado, às 20h | Domingo, às 18h.
Local: R. Barra Funda, 637 – Barra Funda
Ingressos: R$ 15,00 (inteira) | R$ 7,50 (meia)
Duração: 60 minutos
Classificação: 14 anos
OFICINA – TEXTO, CORPO, SUBTEXTO
(com Rui Xavier)
Inscrição – solicitar informações pelo e-mail contato@corporastreado.com
Data: Dia 04 de Dezembro
Horário: Quarta, das 10h às 14h | das 15h às 19h
Local: Rua Lira, 74 – Vila Madalena
Duração: 07 horas
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