Com encenação inspirada no teatro do polonês Tadeusz Kantor e em histórias em quadrinhos e desenhos animados, a versão do grupo Garagem 21 para a peça “Dias Felizes”, de Samuel Beckett, volta em cartaz em São Paulo, desta vez no Teatro do Núcleo Experimental.
O espetáculo conta com apoio da Lei Paulo Gustavo do Estado de São Paulo. A direção é de Cesar Ribeiro e a atuação, de Edgar Castro e Lavínia Pannunzio, indicada ao APCA de melhor atriz pela montagem.
A peça traz a história de Winnie, uma mulher de 50 anos que dialoga de modo otimista sobre um passado glorioso e a esperança de dias melhores. Nessa condição precária, em um cenário desértico, ela se agarra às palavras e a seus últimos pertences para enfrentar a passagem do tempo e comandar seu universo de esperanças contraditórias com a realidade em que está inserida.
Na montagem, a violência do patriarcado, assim como as imposições relacionadas à construção do feminino, tornam-se o centro das discussões. Segundo o diretor, a voz que se ouve na peça é de Winnie, que o tempo inteiro retorna à expectativa de felicidade enquanto narra possibilidades de afeto perdidas no passado e a aridez do estado presente. Além da imobilidade ao estar enterrada, a memória é falha, o sol é constante e seu marido, interpretado por Edgar Castro, permanece indiferente, ao fundo da cena, absorto na leitura de manchetes de velhos jornais.
“Ao mesmo tempo, como um quebra-cabeça, o texto vai remontando uma relação afetiva que começa com a ‘conquista’ seguida por imediato silêncio entre o casal, resultado de um marido presente fisicamente, mas sem nenhum grau de escuta e que apenas grunhe palavras incompreensíveis e, às vezes, algumas frases soltas ou pequenas respostas”, explica Ribeiro.
A montagem utiliza obras como Eichmann em Jerusalém, em que Hannah Arendt propõe que o mal, ao atingir grupos sociais, é político e ocorre onde encontra espaço institucional, gerando a naturalização da violência como processo histórico e sociopolítico. Dessa forma, “Dias Felizes” aborda a desumanização, que condiciona grandes parcelas da população a uma cidadania de segunda classe.
“O isolamento, a escassez de recursos, a natureza hostil e a oposição entre os desejos de luta pela vida e desistência diante das adversidades configuram a obra como uma representação do abandono pelo Estado, pela coletividade e por qualquer suposta divindade organizadora. Mas como garantir a vida de milhões de pessoas vulneráveis socialmente sob uma realidade excludente?”, questiona Cesar Ribeiro.
A proposta de montagem segue a investigação dos sistemas de violência característica do grupo Garagem 21. Em Esperando Godot é investigada a violência estrutural e em O Arquiteto e o Imperador da Assíria o foco está na violência cultural.
Ficha Técnica
Texto: Samuel Beckett
Direção e trilha sonora: Cesar Ribeiro
Atuação: Lavínia Pannunzio e Edgar Castro
Cenografia: J. C. Serroni
Desenho de luz: Domingos Quintiliano
Figurinos: Telumi Hellen
Visagismo: Louise Helène
Direção de produção: Marisa Medeiros
Coordenação geral de produção: Edinho Rodrigues
Fotos: Bob Sousa
Assessoria: Pombo Correio
Realização: Grupo Garagem 21, Brancalyone Produções, Mecenato Moderno e Lei Paulo Gustavo do estado de São Paulo
DIAS FELIZES
Temporada: De 13 de Setembro a 07 de Outubro
Horário: Sextas, Sábados e Segundas, às 20h | Domingos, às 19h
Local: Rua Barra Funda, 637 – Barra Funda
Ingressos: R$ 40,00 (inteira) | R$ 20,00 (meia-entrada) | Compre aqui
Duração: 120 min. (incluindo um intervalo de 15 minutos)
Classificação: 12 anos
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